Regulamentação dos streamings já!
O cinema nacional vive uma de suas melhores fases da história. Com a recente premiação no Oscar de Melhor Filme Estrangeiro para Ainda Estou Aqui (2024) e os aplausos que duraram 13 minutos após a exibição de O Agente Secreto (2025) no Festival de Cannes, o potencial latente do cinema nacional voltou à tona ao lado de discussões sobre a quantidade de obras que importamos, em detrimento das poucas que são exportadas.
Não é de hoje que esse potencial existe em produções nacionais. A pouco mais de 20 anos, Cidade de Deus (2002) chegava à maior premiação do cinema não com uma ou duas, mas sim quatro indicações: melhor direção, melhor roteiro adaptado, melhor montagem e melhor fotografia. E anos antes disso, Central do Brasil (1998) chegara como um dos grandes favoritos ao Oscar de Melhor Atriz pela atuação de Fernanda Montenegro, mas acabou perdendo para a performance de Gwyneth Paltrow em Shakespeare Apaixonado.
É evidente que, mesmo com percalços durante a produção e a falta de incentivo institucional ao cinema, o Brasil ainda consegue certo destaque no cenário mundial, cercado de produções com orçamentos inflacionados e distribuição global. A competição desleal entre o cinema nacional e as grandes produções internacionais, proporcionada principalmente pelo avanço dos streamings, abriu precedentes para que o debate chegasse à Câmara dos Deputados, com a tramitação do Projeto de Lei 2.331/2022 para propor a regulamentação dos serviços de vídeo sob demanda (VoD) no país.
Dentre as propostas, a que mais chama a atenção é o sistema de cotas que prevê pelo menos 20% do catálogo das plataformas com obras brasileiras. Pode parecer uma medida extrema ou protecionista, mas regulações parecidas já foram adotadas em outros países como Espanha, França e Coreia do Sul de forma eficaz.
Além da distribuição nos catálogos, o projeto também inclui o pagamento dessas grandes empresas de streaming na Contribuição para o Desenvolvimento da Indústria Cinematográfica Nacional (Condecine), um tributo do qual elas são atualmente isentas; o mesmo não acontece para pequenos e médios produtores nacionais, que devem arcar com o valor.
A falta de políticas públicas para a regulamentação dos streamings ao longo dos anos acabou desestimulando não só os produtores dos filmes, como também o público, que deixou de ver obras incríveis como Marte Um (2022), O Palhaço (2011) e O Que é Isso, Companheiro? (1997), suprimidas nos catálogos das grandes plataformas, em meio a diversas produções que não criam nenhum tipo de identificação com a população e a cultura brasileiras.
Um estudo do Conselho Administrativo de Defesa Econômica (CADE) mostrou que no ano de 2023 o Brasil foi o 10º país que mais faturou no mercado mundial de VoD, com uma receita de US$ 1,9 bilhão gerada por assinaturas e serviços de streaming. Resta saber se todo esse lucro vai ficar na mão dos países estrangeiros, ou será revertido, de alguma forma, no investimento nacional.
Foto: Tumisu/Pixabay
