Umbuzeiro Filmes, O Silêncio das Palmas e o cinema do interior

A Constituição Federal de 1988 é um grande marco, não só para a nossa democracia, mas também um modelo a seguir para garantir à população todos os direitos fundamentais. Por conta do seu forte teor social, ela foi apelidada como Constituição Cidadã e dentre diversos direitos assegurados, um deles está presente no Art. 215, que descreve que “o Estado garantirá a todos o pleno exercício dos direitos culturais e acesso às fontes da cultura nacional, e apoiará e incentivará a valorização e a difusão das manifestações culturais”.

Entretanto, como o país possui intrínseco às suas raízes históricas as desigualdades sociais e econômicas, a cultural também não fica de fora. Devido à falta de inclusão e consequente falta de acesso à uma cultura que com o passar do tempo se tornou “erudita”, os grupos marginalizados passaram a se redescobrir com manifestações próprias, feitas em suas comunidades e para suas comunidades, a exemplo da capoeira, do samba, funk e rap. Tais manifestações sofreram retaliações, como proibições, repressão e preconceito que perduram até os dias de hoje.

Algumas medidas foram adotadas a fim de mitigar os danos, como a Lei Rouanet e, mais recentemente, a Lei Paulo Gustavo, aprovada em 2022. E é nesse cenário, com um pouco mais de incentivo à cultura que surgiu a distribuidora Umbuzeiro Filmes, em setembro de 2024. Com produções independentes, a distribuidora busca dar visibilidade e projeção para obras cinematográficas feitas no interior do Sudoeste Baiano.

O mais novo lançamento da Umbuzeiro é o documentário O Silêncio das Palmas, dirigido por Vinícius Pessoa, em que acompanhamos a vida de uma família circense enfrentando dificuldades durante o contexto da pandemia da Covid-19. A equipe reduzida e a falta de recursos financeiros durante a produção do longa atuam em sintonia com a própria temática desenvolvida: uma realidade de dificuldades que para ser documentada também passou por vários percalços na trajetória de quase cinco anos para que o filme fosse enfim lançado.

O Silêncio das Palmas. Reprodução: Retratos Filmes / Ato3 Produções

Por meio do cinema independente, a sétima arte ganha novos olhares e perspectivas. Novas ideias ganham a possibilidade de serem experimentadas a todo momento, seja uma temática que não costuma ser abordada nas grandes mídias, um enquadramento que não segue os padrões audiovisuais pré-estabelecidos e até mesmo a própria estrutura de roteiro, que não necessariamente se obriga a apresentar grandes heróis, um antagonista com suas motivações e um final feliz.

Uma forma de falar sobre a vida” e “uma busca por respostas que talvez a gente nunca tenha”. Essas foram as palavras do cineasta Vinícius Pessoa para descrever o que é o cinema e sua complexidade. O primeiro longa do diretor já carrega muito da sua assinatura, como as questões políticas, o medo, transmitido pelos personagens em suas obras, as minorias em papéis de destaque e, principalmente, as relações humanas como plano principal.

A sensação agridoce presente no desfecho de O Silêncio das Palmas não é prazerosa e nem satisfatória, mas, para o recorte delimitado pela história e o contexto pelo qual ela se passa, é bastante realista. A própria ação de conceber uma produção desta já se mostra como um ato político em si, já que tanto o filme, quanto as produtoras, o diretor e o público destacam a principal característica do cinema independente: resistência.


Allan Victor

Formando do curso de jornalismo na Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia (UESB). Fundador do canal do YouTube sobre cultura pop e história intitulado Pop Show TV.

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