Caju ecoando o Futuro

Divulgação/Globo

Há algo de profundo na maneira como Liniker se impõe, não apenas como cantora, mas como um símbolo de resistência e transcendência. Quando ela subiu ao palco para receber as mais altas honrarias do Prêmio Multishow 2024 – Capa do Ano, MPB do Ano, Álbum do Ano e Artista do Ano – parecia que não era só ela que estava sendo aplaudida, mas toda uma geração que se recusa a ser silenciada. A travesti preta, com seu disco Caju, é a voz de quem nunca desistiu de lutar pelo amor em todas as suas formas, por todas as suas possibilidades. “Deixa eu ficar na tua vida, morar dentro da concha, do teu abraço não quero largar”, ela canta, e é isso que a arte de Liniker é: um abraço que abraça quem precisa ser abraçado.

O mais impressionante, porém, não é apenas o reconhecimento da crítica, mas o fato de que eu mesma, em minha retrospectiva do Spotify, vi Liniker como uma das minhas artistas mais ouvidas no ano. “Tudo”, a música que mais ecoou em meus fones, com sua melodia cheia de promessas de amor, já foi trilha sonora de muitas postagens, reflexões e de caminhares. É um grito de resistência no meio de um mundo que tenta nos calar. Porque não há nada mais poderoso do que a coragem de se entregar ao amor, e não há nada mais audacioso do que uma mulher, preta, trans, ocupando o espaço que sempre foi negado a ela.

Esse reconhecimento não é só um prêmio. É uma declaração. A cultura negra, longe de ser uma anedota, é a raiz do Brasil. Como pude ver ao assistir ao show de Caetano e Bethânia na Bahia, os irmãos do recôncavo, ovacionados em sua terra natal, são o pulmão dessa nação. A arte deles resgata e reconstrói a alma do povo. E Liniker, assim como eles, sabe que a arte é o caminho para nossa redenção.

Agora, enquanto celebramos a potência de Liniker, não podemos esquecer que a arte também é a nossa maior ferramenta de transformação. A travesti preta, com seu álbum Caju, oferece a todos nós uma chave para as possibilidades do amor, para a luta contra a opressão e para a busca constante pela liberdade. O que ela canta não é apenas sobre a dor da rejeição, mas sobre a construção de um mundo em que o amor, de fato, é tudo. E como Liniker mesmo diz, “invisto em te ver, pago quanto for”. Se para ver esse amor real, imenso, a gente precisa dar tudo, que assim seja.

É nesse espaço de ousadia e resiliência que o Brasil vai se salvar – nas vozes de quem não cede, nas canções que nos lembram de quem somos e de onde podemos chegar.


Laís Sousa

Jornalista-marketeira-publicitária comunicando em redes sociais de segunda a sexta. Escritora e viajante nas horas cheias e extras. Deusa, louca, feiticeira com trilha sonora em alta. Leitora, dançarina e pitaqueira por esporte sorte. Vamos fugir!
@laissousa_
laissousazn@gmail.com

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