A esperança é realmente a última que morre!
Antes de contar mais uma das minhas aventuras cotidianas, quero avisar que, assim como naquela frase falsamente atribuída a Clarice Lispector, tenho medos bobos e coragens absurdas!
— Mãe, o carro chegou! É sempre inútil, mas tentei apressá-la.
— O sorvete, Tati!
Corri até a cozinha para buscar a pequena caixa de isopor onde coloquei o pote. Entramos no veículo. Cumprimentamos o motorista e em seguida um alegre diálogo se estabeleceu entre os dois. Eu ia ouvindo e olhando a rua, quando de repente senti uma presença estranha. Maldita sensibilidade! Olhei para o teto. Uma esperança. Verdíssima! Quantos segundos teriam se passado entre a percepção do perigo e o coração quase sair pela boca?
-– Moço, pode parar o carro, por favor?
— Aconteceu alguma coisa, moça? Está se sentido mal? — Perguntou ele.
— Que foi, Tati? — Perguntou ela.
—Tem um bicho aqui atrás. — Respondi.
— Ah, é uma esperança. Tem uns três dias que ela está aí.
Demorei um pouco para processar aquela informação (de tão absurda que era) e depois expliquei que tenho medo do inseto. O bicho voou e antes que pousasse na minha janela, me joguei para o outro lado. Vou morrer. Pensei!
Anunciei que iria descer. Outra vez, pedi a ele que parasse o carro. Não fui atendida. Eu já estava desesperada e minha mãe repetia que “a bichinha” não faz nada! Era o fim, como diria meu padrinho!
A esperança voou novamente e parou no volante. O motorista, calmo como um monge, contou que havia lavado o carro no dia anterior e tivera o maior cuidado para que a visitante não “fosse embora”. Vá por mim: a pior coisa é uma pessoa muito tranquila, quando você precisa que ela seja enérgica! Ele disse que o fato daquele grilo-verde aparecer em seu veículo era sinal de sorte! A crendice foi alimentada por minha genitora, traidora, que em nenhum momento se preocupou com meu estado emocional.
O bicho voltou para a parte traseira e eu, reunindo o pouco de dignidade que me restava, ameacei descer do carro em movimento, se ele não tomasse alguma providência! Só aí o homem teve uma atitude e encostou. Esticou o braço e pegou a esperança, fechando-a em sua mão direita, numa espécie de concha, com todo o zelo, para não machucá-la. Devia estar me julgando uma histérica. E isso porque não era uma barata!
Eu ali, a ponto de um colapso, ia protestando! Falei que era um absurdo manter um inseto dentro de um automóvel por três dias, acreditando que isso pudesse significar algo de bom. Que aquilo era uma bobagem. Só não disse que era estupidez porque, mesmo no auge da minha raiva, consegui segurar a língua. O que é raro, inclusive. O homem dirigiu até o meu local de trabalho utilizando somente a mão esquerda, para proteger um bicho. Inacreditável! Quando eu finalmente saí do carro ele soltou o inseto e seguiu com minha mãe.
Naquele fim de tarde, quando solicitei uma corrida por aplicativo para ela e adicionei uma parada para mim, acreditava estar fazendo um bom negócio, economizando tempo e dinheiro. Mas ganhei palpitações horríveis, tive vontade de voar no pescoço de um trabalhador e ainda pude constatar que a compaixão nem sempre vem dos lugares mais esperados, como o coração materno, por exemplo. Se a tal esperança traz sorte, o azar foi todo meu!