Se tudo é política, por que não falar dela?
A semana passada, em Brasília, foi bastante agitada. Ao indicar o Ministro da Justiça, Flávio Dino, ao Supremo Tribunal Federal e Paulo Gonet para a Procuradoria Geral da República, o Presidente Luís Inácio Lula da Silva agradou a uns e desagradou a outros, o que é normal. Contudo, entre os que ficaram mais decepcionados estão aliados de esquerda, como membros do PSOL (Partido Socialismo e Liberdade), que apontam para a necessidade de mais mulheres e negros no STF. Logo depois das indicações, Lula viajou para a Arábia Saudita e, enquanto dava continuidade em sua agenda internacional, aqui no Brasil o debate racial, que já vinha acontecendo com destaque em razão do mês da consciência negra e dos últimos casos de racismo noticiados, ganhou mais força. Em veículos da imprensa e nas redes sociais foi enorme a repercussão das indicações de Lula.
Ao mesmo tempo em que uma parcela da população se ocupava em discutir o assunto, uma outra o ignorava completamente. Nessa segunda, há quem não se interessa pelo tema porque acredita que não lhe afeta e existe também quem simplesmente não discute essas e outras questões relacionadas à política. Como um pensamento puxa o outro, me lembrei de já ter ouvido, de tanta gente, a famosa frase “eu odeio política”. Mas por que, se o homem é, naturalmente, um animal político, segundo Aristóteles? A reflexão agora se dá num contexto mais amplo. Quando fazemos um resgate histórico do termo “política”, descobrimos que ele deriva do grego “politikos”, utilizado para designar os cidadãos que viviam na “Polis”, palavra que se refere à cidade. Portanto, política, em sua origem, diz respeito à vida comunitária.
No dicionário, política é a arte ou ciência de governar, de organização, de direção e administração de nações ou Estados, entre outros significados. No sentido figurado, ela é a capacidade de o indivíduo relacionar-se com os outros para atingir seus objetivos. Quem nunca ouviu a expressão “política da boa vizinhança”? Agora, caro leitor, estimada leitora, faço-lhes umas perguntinhas: você já negociou um contrato de locação de um imóvel, ou as datas de prova com professores e professoras na escola, na universidade? Já reivindicou melhores condições salariais e de trabalho? É isso mesmo que concluiu! Seguindo essa trilha de conceitos e definições, cientes de que vivemos em sociedade, constatamos que a política permeia todas as áreas da nossa existência. O planejamento para educação, segurança pública, saúde, cultura, esporte, saneamento básico, lazer e o valor dos impostos que pagamos, por exemplo, é feito por ela.
Lamentavelmente, muitas pessoas, decepcionadas com escândalos de corrupção envolvendo seus representantes, foram levadas a confundir a boa política com a politicalha, ou a política rasteira, feita por aqueles que, ao invés de contribuir para o bem coletivo, causam enormes danos a ele. E o caminho para desconstruir essa ideia equivocada passa pela educação, que em nosso país ainda é precária em vários aspectos. É necessário discernir entre os bons e maus agentes públicos com mandato, para evitar que a política, enquanto aquilo que nos rege, seja demonizada. Tudo é política, mesmo. Todos nós, e não apenas aqueles que disputam os processos eleitorais, fazemos política. Negá-la, portanto, seria negar a nossa própria essência.